Mais especificamente, defendemos que as demissões afetam negativamente as pessoas que permanecem na organização. Consequentemente, a empresa – se é que podemos abstrair a idéia de todo aí contida das pessoas que o compõem – sofre seus efeitos. Neste sentido, é lógico supor que a condução do processo é fundamental para antecipar esses possíveis problemas e solucioná-los ou amenizá-los. Isto, claro, supondo que o corte de pessoal seja inevitável.
A atenção a diversos aspectos da condução do downsizing justifica-se não apenas por razões ético-humanistas mas também por uma apreciação prática – embora profunda – das relações custo-benefício envolvidas. Isto porque subestimar o fator humano nesse processo levará a problemas organizacionais em curto, médio e longo prazos.
Como vimos, o downsizing é, em grande parte, resultante de pressões do ambiente competitivo. A diferença é que ele pode ser fruto imediato dessas pressões ou pode ser resultado de uma adaptação gradativa da empresa, de maneira a deixá-la pronta a responder de maneira mais eficaz a pressões futuras. Independente dessa diferença, a forma como ele é implementado pode acentuar ou amenizar suas potenciais desvantagens, entre as quais cito apenas algumas presentes na literatura:
• Desperdiça o capital intelectual acumulado nas organizações;
• Pode indicar uma visão das organizações sob uma perspectiva unidirecional (top-down);
• Efeito negativo na responsabilidade e na imagem social da organização.
Todos esses pontos são importantes e representam ameaças ao funcionamento subsequente da empresa. Se esta não tem uma política adequada de gestão do conhecimento, as pessoas que saem não deixarão rastros, seu conhecimento acumulado (explícito e tácito) será levado com eles e provavelmente usados por outras empresas. A imposição das medidas de maneira impessoal e ríspida será interpretada de maneira negativa pelos que ficam e terá efeitos perversos sobre os mesmos. Finalmente, o efeito na imagem da organização diminuirá sua capacidade de atrair talentos e poderá até causar impacto no valor de sua marca.
O nosso propósito, porém, é fazer um recorte mais preciso e centrar sobre o impacto do downsizing nas pessoas:
Aumento da carga de trabalho (há um autor inglês, crítico da re-engenharia, que diz que o principal desafio dessa prática é convencer os empregados a fazer mais pelo mesmo salário);
Amento do stress laboral;
Aumento da percepção de insegurança no emprego;
Uma série de falhas na condução do processo podem acentuar esses efeitos nos sobreviventes, mas se;
de uma maneira geral o downsizing foi mal planejado (por falha de previsão ou por incompetência);
a comunicação durante o processo foi falha e deu margens a ruídos;
a liderança não se mostrou presente durante o processo e não apresentou claramente os critérios para demissões;
os condutores do processo falharam em calcular acertadamente o efetivo mínimo para a futura situação da empresa;
se a empresa não antecipou aos funcionários se novas demissões viriam em seguida das primeiras;
a empresa não teve a preocupação de prover serviços de re-colocação (outplacement) para aqueles que foram demitidos, ou de apoio psicológico aos que permaneceram;
os efeitos podem ser absolutamente devastadores para a saúde mental daqueles que sobreviveram aos cortes.
É bem verdade que as pessoas reagem de maneiras diferentes ao downsizing, assim como o fazem em relação a qualquer evento estressor – a esse propósito Mishra & Spreitzer (1998) apresentam uma interessante tipologia de respostas ao downsizing usando como base teorias sobre o estresse. Independente disso, as falhas acima citadas aumentarão as chances de mais pessoas reagirem de maneira negativa (destrutiva e passiva, para falar na tipologia dos autores).
O sobrevivente ao downsizing pode apresentar sintomas físicos e mentais relacionados com ansiedade prolongada (até mesmo desenvolver quadros graves), percepções de injustiça, perda de confiança na gestão da empresa, queda do comprometimento com a empresa, medo de mudanças, redução na satisfação e motivação, diminuição da disposição para tomar ações que impliquem riscos (inerentes a certos cargos) e, em geral, uma sensação de impotência em relação aos acontecimentos em seu entorno.
É óbvio, por razões humanitárias, que essa é uma situação indesejável. Mas mesmo olhando sob a ótica fria do próprio funcionamento da empresa, não são menos óbvios os efeitos devastadores das consequências acima listadas. Por exemplo, o empregado sem confiança na sua liderança, com medo de mudança, inseguro de seu emprego, provavelmente fará o mínimo possível – apenas o mínimo de trabalho requerido – para evitar a sua própria demissão.
Os efeitos negativos que estão associados à percepção de insegurança no trabalho estão amplamente demonstrados na literatura organizacional. Especificamente em relação ao downsizing, um estudo longitudinal de Armstrond-Stassen (2004) identificou que gerentes intermediários, em geral, sentiam-se menos seguros no emprego que gerentes executivos, e, portanto, apresentaram mais sintomas relacionados com o estresse e menor desempenho que estes últimos. Com semelhante propriedade estão demonstrados o impacto negativo da queda do comprometimento e da motivação, da falta de confiança organizacional etc.
Ademais, o downsizing - quando conduzido negligenciando o fator humano - será interpretado como uma quebra do contrato psicológico. Este representa uma concepção acerca da relação de trabalho, tacitamente estabelecida entre empresa e trabalhador, e que determina as expectativas acerca dos papéis desempenhados por ambas as partes. Quando se percebe que esse contrato é quebrado as consequências podem ser irreversíveis; a relação poderá nunca voltar a ser a mesma.
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