quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Quando o resultado da avaliação nos fala mais sobre o avaliador

Em texto anterior, postado aqui, foram discutidas as implicações práticas das concepções dos gerentes em relação aos trabalhadores em geral. Essa discussão apoiou-se em alguns pressupostos fundamentais:

• As pessoas têm concepções tácitas relativamente estáveis acerca da natureza humana e do comportamento humano (ex.: hipóteses sobre o que motiva pessoas a fazer algo);
• Essas concepções podem ser “positivas” (o homem trabalha por prazer; realiza-se através do trabalho; busca o constante desenvolvimento) ou “negativas” (o trabalhador trabalha pelo salário; busca fazer o mínimo necessário, etc.) e são, essencialmente, implícitas;
• Tais concepções ou teorias, assumidas tacitamente por gestores, influenciam seu estilo de gestão;
• Essas concepções podem ser identificadas e mensuradas através de procedimentos de investigação.

Dito isto, passo a falar de um estudo com o qual me deparei recentemente e que tem relação forte com essa temática.

O artigo ao qual me refiro (Heslin, Latham & Walle, 2005; disponível gratuitamente na internet) relata o resultado de quatro experimentos que buscaram identificar o impacto das “teorias implícitas” na avaliação de desempenho.

Antes de passar aos resultados, importa esclarecer o que, para nosso propósito, constituem as teorias implícitas:

As teorias implícitas são um conjunto articulado de construções mentais que qualquer indivíduo, leigo ou investigador, pode produzir acerca dos atributos pessoais (aptidões, habilidades, personalidade, etc.)”

O estudo a que me refitro segue uma linha consistente na literatura da área, e especifica o foco da análise na distinção entre Incremental Theory e Entity theory. Estas são duas teorias implícitas acerca da natureza humana que podem ser resumidas da seguinte forma:

- Indivíduos que assumem uma “entity theory” concebem atributos pessoais (ex. inteligência) como características relativamente estáveis, fixas.
- Indivíduos que assumem uma “incremental theory” concebem atributos pessoais como maleáveis, passíveis de mudança.

O objetivo da pesquisa foi identificar como essas teorias – certamente assumidas de forma tácita em diferentes graus por todos nós – afetam o julgamento que gestores fazem do desempenho de empregados, ou seja, como elas afetam o processo de avaliação do desempenho laboral.

O primeiro experimento foi realizado com 82 gestores.

Em primeiro lugar, os gestores preencheram questionários que buscaram identificar em que medida os pressupostos dos participantes alinhavam-se à entity (atributos pessoais são estáveis, fixos) ou à incremental theory (atributos pessoais são maleáveis, mutáveis).

Em seguida, foi-lhes apresentado um vídeo com eventos onde um empregado demonstrava desempenho fraco (especificamente em habilidades de negociação). Em seguida o vídeo mostrou dois episódios onde o mesmo empregado demonstrava boas habilidades de negociação. Os gestores avaliaram o desempenho do empregado do vídeo em ambas as situações. O resultado foi o seguinte:

• Com relação à avaliação dos primeiros episódios (mostrando mau desempenho), os escores de desempenho atribuídos pelos gestores não variaram em função das teorias implícitas assumidas pelos mesmos. Contudo, em relação à avaliação dos episódios seguintes (de demonstração de boa performance) verificou-se que os gestores alinhados aos pressupostos da “incremental theory” reconheceram melhor o aumento de desempenho que aqueles gestores alinhados à “entity theory”.

Ou seja, gestores que acreditam que os atributos pessoais são maleáveis reconheceram de maneira mais precisa a alteração no comportamento/desempenho do empregado do vídeo, enquanto os gestores cuja concepção aproxima-se da “entity theory” ignoraram de forma mais expressiva tal mudança, atribuindo escores mais consistentes com suas avaliações iniciais.


O segundo experimento utilizou o mesmo vídeo. Contudo a ordem foi invertida: os episódios de baixa performance foram mostrados por último. O objetivo foi verificar se as teorias implícitas afetam de alguma forma o reconhecimento, por parte de gestores, de baixo desempenho após observação de episódios de alto desempenho do mesmo empregado. O resultado foi o seguinte:

• Novamente foi identificado que alguns gestores reconhecem a mudança negativa no desempenho mais do que outros. Mais precisamente, os gestores com pressupostos consistentes com a “incremental theory” reconheceram de forma mais consistente a mudança no desempenho, conferindo avaliações mais negativas nos episódios de baixa performance do empregado do vídeo.

De maneira geral, os autores concluem que, quando comparados a gestores alinhados à “entity theory”, aqueles alinhados à “incremental theory” parecem mais inclinados a interpretar as informações disponíveis no ambiente e utilizá-las para sua avaliação. Em contrapartida, gestores alinhados à “entity theory”, nesse caso, parecem fortemente influenciados pelas primeiras impressões formadas na avaliação e, nesse sentido, tendem a negligenciar as informações subseqüentes relacionadas ao desempenho do empregado.

Os resultados dos outros dois experimentos relatados apenas reforçam e refinam aqueles encontrados nos dois primeiros e contribuem para a sustentação das hipóteses iniciais quanto à influência das teorias implícitas na avaliação de desempenho.

Tais resultados ajudam a compor um vasto campo de pesquisa que vem reunindo de forma sistemática resultados empíricos que demonstram a influência de características do avaliador em processos de avaliação e julgamento.

As implicações para o mundo do trabalho são inúmeras. Os resultados aqui discutidos identificam mais um componente influente nos processos de avaliação de desempenho.

Em tese, a avaliação de desempenho busca retratar comportamentos e atitudes do empregado. Contudo, cientes da influência de características do avaliador (teorias implícitas, atitudes e personalidade) e ainda do lugar que o processo de avaliação de desempenho ocupa no sistema organizacional (sua função política, sua relação com demais processos, etc) temos a certeza de que, mais do que qualuqer coisa, temos ali informações que refletem aspectos outros que não o real desempenho do empregado. É importante ter isso em mente quando pretendemos fazer uso dos resultados desse processo.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Automação e Trabalho

O desenvolvimento tecnológico acentuado que verificamos nos pequenos fatos do cotidiano vem, há muito tempo, alterando significativamente o mundo do trabalho. Mais especificamente, a implementação de tecnologias avançadas têm modificado a forma como as pessoas se relacionam com suas atividades e com o trabalho, em geral.
Há um texto bastante interessante (Ironias da Automação, de 1983) onde pode-se verificar que o debate dentro desse tema é amplo e razoavelmente antigo. A autora do texto, Bainbridge, aponta-nos alguns dos paradoxos decorrentes do processo de automação de sistemas. Ironias, digamos assim, com os quais a indústria de processos tem de lidar embora nem sempre elas apareçam com fácil inteligibilidade.
É bem verdade que o texto tem mais de duas décadas. Claro está que o conhecimento relativo à automação de sistemas percorreu um longo caminho de acertos e erros, agregando uma série de procedimentos que tornaram o “casamento” homem-máquina um pouco mais tranqüilo. Pode-se dizer, com certeza, que temos hoje sistemas muito mais seguros que há duas décadas.
Contudo, algumas das “ironias” apontadas pela autora ultrapassam as décadas pois retratam o que está na essência dos problemas enfrentados pela automação de sistemas de risco. Ademais, as ironias ilustram os problemas enfrentados quando encara-se a automação como panacéia para todos os problemas da indústria.
Com grande certeza, pode-se dizer que a automação trouxe enormes benefícios para a indústria: otimizou processos, aumentou a segurança das pessoas e dos equipamentos, instituiu vantagens ergonômicas para trabalhadores, etc.
Vista assim sob essa perspectiva, não faria muito sentido falar em ironias relacionadas com a automação. Contudo, na base da visão utópica da automação estão paradoxos. Principalmente quando assumimos que onde a automação goza de status de solução última, está a associação do trabalhador ao erro e à ineficiência.
Bainbridge afirma que a necessidade de não depender da capacidade dos operadores está na base da motivação em automatizar sistemas (ou partes significativas destes). Contudo, ao buscar a solução para certos problemas, o processo de automação introduz outros (de natureza distinta) que representam ameaças à confiabilidade do sistema.

De fato, a primeira – e mais básica – ironia é apontada pela autora:
- Ao mesmo tempo em que os sistemas são automatizados para evitar a dependência na eficácia (duvidosa) do operador, a este último é dada a tarefa de supervisionar e monitorar as falhas desses mesmos sistemas. Ou seja, o designer do sistema que busca eliminar o operador do mesmo, confere a este último o papel (impossível) de árbitro deste.

Uma segunda ironia parece mais sutil:
- Ao tentar evitar um erro operacional, a automação dos sistemas aumenta a probabilidade de erros de design, os quais são consideravelmente mais complexos para solucionar.

Uma outra ainda diz respeito ao desenvolvimento da habilidades e conhecimentos do operador.
- Com a automação, o nível de conhecimento requerido para operar o sistema aumenta significativamente. Ora, o conhecimento acerca do processo e as habilidades envolvidas na operação são construídas a partir de longa experiência, de constante feedback de suas atividades. A automação, contudo, impõe sérias dificuldades ao processo de construção desse saber. Ou seja, ao mesmo tempo em que a automação requer mais conhecimento por parte do operador, impõe dificuldades para o desenvolvimento do mesmo. Neste sentido, aumenta-se consideravelmente a necessidade de treinamento e de simuladores de alta precisão para que o operador tenha condição de (e, principalmente, sinta-se apto a) intervir sobre o sistema quando necessário.

De forma geral, as observações de Bainbridge nos revelam o quanto a automação, quando pensada negligenciando o componente humano de seu sistema, pode ter efeitos danosos. A visão simplista e negativa do trabalhador que subjaz grande parte das aspirações utópicas da automação, como epítome do progresso humano, pode trazer conseqüências graves para o trabalho.
Se por um lado a automação permite a redução do esforço físico, por outro pode ser também fonte de adoecimento do operador do sistema, a quem é dada uma tarefa absolutamente entediante e penosamente crítica, de grande responsabilidade.
Ao mesmo tempo em que diminui-se a exposição do trabalhador a situações de risco e condições severas de trabalho, impõe uma carga de trabalho mental, a qual pode ser tão severa e perigosa.
Finalmente, se a automação por um lado implementa melhorias no processos tornando-os mais eficazes, ela pode precarizar as relações de trabalho e aprofundar a lacuna entre concepção e execução do trabalho, raiz de muitos dos problemas que as organizações enfrentam.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Liderança e Saúde do Trabalhador

O tempo tem sido curto ultimamente. Em breve devo atualizar o blog com novos textos. Nesse ínterim, deixo aqui o link para uma interessante matéria sobre liderança e seu impacto sobre o bem estar dos trabalhadores.

TEXTO