Porém, com o tempo, a busca espontânea e excitante por conhecer novos fenômenos transforma-se numa caminhada desinteressada e muitas vezes voltada apenas para a confirmação de nossas certezas já construídas. Esquecemos a máxima popperiana de que toda verdade científica é provisória e deixamos de buscar alternativas. E nem sempre temos a humildade para reconhecer a fragilidade das bases sobre as quais erguemos nosso pequenos grandes dogmas.
Assim, as teorias que desenvolvemos acerca de como funciona a realidade deixam de ser instrumentos que auxiliam na percepção do mundo para tornar-se lentes rígidas que ofuscam a enorme complexidade contida naquilo que pretendemos ver. Passamos a ver o que queremos. Selecionamos aquilo que não contradiz o que já “sabemos” e somamos isso às inúmeras outras “evidências” que colhemos ao longo da vida. Enfim, fechamo-nos para possibilidades fora de nossos modelos de mundo.
Essa espécie de estereotipia ou “mini-delírio” (chamo delírios porque muitas das convicções que criamos são absolutamente impermeáveis a qualquer evidência contrária) nos acompanham com maior ou menor intensidade na relação com outras pessoas. Aplicamos nosso “modelo rígido” de comportamento humano (ou, digamos, nossa concepção de natureza humana, construída ao longo da vida) e realizamos julgamentos, interpretações, deduções e predições coerentes com o mesmo.
No trabalho a coisa não é diferente. Arriscaria dizer que no trabalho a dimensão desse problema torna-se absolutamente evidente uma vez que o trabalho é a esfera central da vida de praticamente toda a população mundial.
Há praticamente meio século, McGregor (Foto) nos chamava a atenção para a importância das atitudes que gestores formam em relação a seus empregados. Argumentava ele que é preciso que conheçamos “as lentes” através das quais os gestores enxergam o trabalho, os trabalhadores e a relação entre empresa e empregados para compreendermos plenamente o processo de trabaho e diversos fenômenos a este relacionados.
A primeira, denominada Teoria X, é aquela em que os gestores consideram que os trabalhadores em geral, por sua “natureza” não gostam de trabalhar. A motivação para o trabalho é essencialmente financeira e o trabalho é percebido como um “mal necessário” para o alcance de objetivos pessoais . A segunda, chamada Teoria Y, é aquela adotada por gestores que consideram que os trabalhadores são naturalmente motivados para o trabalho e, portanto, este é o espaço privilegiado onde as pessoas satisfazem suas necessidades de desenvolvimento e auto-realização.
Apesar de ter descrito grosseiramente a contribuição de McGregor, está claro que as diferentes concepções de natureza humana contidas em cada uma dessas orientações levam a consequências diversas. Os gestores da primeira certamente acreditarão que o seu papel é fundamentalmente o de controlar, fiscalizar, o processo de trabalho e os empregados são vistos como máquinas que não devem executar nada além daquilo para que foram “programadas”. Os gestores da segunda vêem a sua função como a de um facilitador do desenvolvimento do processo de trabalho, e buscará motivar os empregados através da influência e considerando suas necessidades de auto-realização. Dito de outro modo, reconhecer a importância dessas concepções nos permite compreender, sob um ponto de vista privilegiado, aquilo que acontece no ambiente de trabalho, nos dá pistas sobre os motivos de ações gerenciais.